Cuidar da Mulher, Para Além do Cancro: A Força da Equipa Multidisciplinar
Por João Vasco Barreira, Oncologista
O diagnóstico de cancro da mama metastático representa um ponto de viragem na vida de uma mulher e da sua família. A partir desse momento, a energia e o foco concentram-se, naturalmente, no combate à doença. Na oncologia moderna, contudo, sabemos que tratar o cancro com sucesso vai muito além de atacar o tumor. Significa cuidar da pessoa na sua totalidade, tendo em conta as suas necessidades, os seus receios e a sua identidade. E, para o fazer de forma eficaz, nenhum médico trabalha sozinho.
Podemos pensar na equipa que cuida de uma doente oncológica como uma orquestra. Nesta orquestra, o oncologista assume frequentemente o papel de maestro, aquele que tem a visão global do percurso terapêutico e que coordena os diferentes músicos. Cada um destes elementos é um especialista fundamental numa determinada área, e só a sua atuação conjunta e afinada permite alcançar o melhor resultado: não apenas mais tempo de vida, mas mais qualidade de vida.
Os primeiros músicos que entram em cena são, habitualmente, o cirurgião e o radioncologista, que, em conjunto com o oncologista, definem a estratégia de tratamento da doença. Mas a melodia do cuidado não pode, nem deve parar aqui. Os tratamentos oncológicos, embora cada vez mais eficazes, trazem consigo efeitos secundários que impactam o corpo e a mente de formas muito distintas. É aqui que a orquestra se expande.
O especialista em psico-oncologia ajuda a gerir o peso emocional do diagnóstico e dos tratamentos. O nutricionista orienta a alimentação para manter a força e a energia. O fisioterapeuta trabalha na recuperação da mobilidade e na gestão da dor. Cada um destes profissionais é essencial para garantir que a mulher consegue tolerar os tratamentos da melhor forma e manter a sua funcionalidade no dia a dia.
No entanto, há uma parte desta sinfonia que, demasiadas vezes, é tocada em silêncio: a que diz respeito à intimidade e à sexualidade. As alterações na imagem corporal provocadas pela cirurgia, a menopausa induzida pelos tratamentos, a fadiga ou a dor são barreiras muito reais ao bem-estar sexual. E esta não é uma questão "menor" ou um luxo. É uma dimensão central da identidade, autoestima e saúde de uma mulher.
Por isso, a nossa orquestra deve, obrigatoriamente, incluir o especialista em sexologia. Este profissional possui as ferramentas para ajudar a mulher e o casal a navegar estas águas, a encontrar novas formas de intimidade e a gerir os sintomas físicos que dificultam uma vida sexual satisfatória. Integrar a saúde sexual no plano de cuidados é reconhecer que a mulher à nossa frente é mais do que a sua doença.
A abordagem multidisciplinar é, hoje, o padrão de ouro em oncologia. É a garantia de que cada doente está no centro de uma rede de conhecimento e cuidado, focada em todas as suas necessidades.
Iniciativas como a campanha "O Prazer é todo meu| Conversas deintimidade" são fundamentais,porque abrem a porta para estas conversas, permitindo que nós, médicos, e as nossas doentespossamos, em conjunto, garantir que a música da vida continua a ser tocada em toda a sua plenitude.
Elaborado em setembro de 2025 | PP-UNP-PRT-1392